26 de julho de 2010

O ENCONTRO DE DIÓGENES (O CÃO) COM ALEXANDRE (O GRANDE)

Igualmente famosa é sua história com Alexandre, o Grande, que, ao encontrá-lo, ter-lhe-ia perguntado o que poderia fazer por ele. Acontece que devido à posição em que se encontrava, Alexandre fazia-lhe sombra. Diógenes, então, olhando para a Alexandre, disse: "Não me tires o que não me podes dar!" (variante: "deixe-me ao meu sol"). Essa resposta impressionou vivamente Alexandre, que, na volta, ouvindo seus oficiais zombarem de Diógenes, disse: "Se eu não fosse Alexandre, queria ser Diógenes."

PROCURA-SE O HOMEM: DIÓGENES, O CÃO!

Autor: Professor Gilmar Zampieri (Mestre em Filosofia e Teologia)

Procura-se o homem Diógenes. Não que ele tenha se escondido ou seja um foragido. Sequer foi um perigo. Ou talvez tenha sido e por isso a tradição livrou-se dele punindo-o com o ostracismo intelectual. O ostracismo oficial grego significava a expulsão política e o exílio, por dez anos, daquele indivíduo que se afigurava como um inimigo potencial do Estado. Já o ostracismo imposto aos cínicos, e entre eles Diógenes, foi bem superior a dez anos. Após a forte influência exercida pelos cínicos junto aos estóicos e na cultura do período imperial em geral, os cínicos praticamente se retiraram da cena filosófica e em boa medida sequer foram considerados filósofos, opinião essa validada por Hegel nas suas lições de história da filosofia ao dizer que “não há nada particular a dizer sobre os cínicos, pois eles possuem pouca filosofia e não colocaram o que tinham num sistema científico” (HEGEL, 1955, p. 128).
A despeito dessa posição avaliativa, os cínicos renascem atualmente com uma avaliação menos pré-conceituosa, devolvendo-lhe o mérito de um movimento filosófico sério e com interesse duradouro (GOULET-CAZÉ;BRANHAM, 2007, p. 11ss). A sua ressurreição coincide com outras, tais como o epicurismo e ceticismo, típicas de períodos de crise e, sobretudo, períodos de enfraquecimento do político, do ideológico e do metafísico, como é nosso tempo pós-moderno.
Não pretendo estabelecer aqui um balanço histórico da filosofia dos cínicos com possíveis incursões sobre a tradição socrática ou a recepção dos cínicos ao longo da história da filosofia, a não ser naquilo que se afigure como indispensável para compreender o seu representante mais genuíno: Diógenes. É Diógenes, sua vida e pensamento, quem motiva este breve texto. Diógenes que, em pleno dia, irônica e provocativamente saía pelas ruas da Grécia e pronunciava o dito “procuro o homem”. O “procuro o homem”, contudo, não é só uma ironia, mas um dito de alto alcance ético, como veremos. Ele será o nosso procurado, nele concentraremos o foco, mas não antes de situar o movimento a qual ele se inscreve como representante mais ilustre: os cínicos.

A Filosofia do Movimento Cínico

Antístenes (444-365 a. C) é considerado pela tradição como sendo o fundador do movimento cínico. Trata-se de um movimento, mais do que uma escola com mestres e discípulos, com corpo doutrinário sistemático e local específico, como era a Academia de Platão ou o Liceu de Aristóteles. Um movimento que tem em Antístenes seu fundador e em Diógenes a sua culminância e radicalização. O termo “cínico” significa literalmente “a maneira de um cão (Kyon)”. A palavra tem uma gênese etimológica disputada por duas posições concorrentes. De acordo com uma delas a palavra cínicos (kynicos) vem de Kynosarges, ginásio dedicado a Hércules no qual Antístenes costumava conversar. Kynosarges pode significar tanto cão ágil quanto carne de cão ou ainda cão branco. Essa variação de sentidos da palavra Kynosarges faz com que alguns postulem que a gênese não se deve ao nome do ginásio, mas sim ao estilo de vida tanto de Antístenes quanto de Diógenes que eram comparados a um cão (Kyon) e daí o nome “cínico”, isto é, “a maneira de um cão”. Diógenes representa tão bem essa condição que ele mesmo se denominava “Diógenes, o Cão” (D.L. p.167).
A coincidência das duas etimologias, nome do ginásio mais o estilo de vida, explica o porquê esses filósofos tenham-se autodenominado “cínicos”, mesmo que a disputa entre as etimologias não possa ser levada a termo. De qualquer forma o “a maneira de um cão” lhe cai muito bem como metáfora de uma postura de vida e de pensamento. Os cínicos eram conhecidos por serem francos e diretos (tal como um cão que late e abana o rabo), por saberem distinguir um filósofo do não-filósofo (tal como o cão distingue o amigo do inimigo), mas acima de tudo por viverem em público como os cães, livres e despudoradamente indiferentes às normas estabelecidas. O que a sociedade grega via com pudor e vergonha, os cínicos viam com naturalidade e despudor. O epíteto canino, aparentemente insultuoso, era também reivindicado pelos cínicos pela forma de pensar contra a tradição, contra as regras, contra os valores da pólis, contra cultura dominante, tudo isso simbolizado por Diógenes, como veremos, na “desfiguração da moeda”.
Agora, pode-se dizer que o movimento cínico é uma filosofia? De imediato pode-se dizer que se o conceito de filosofia for o hegeliano, a saber, um saber sistêmico sobre o ser, o pensar e o agir, então realmente há pouco de filosofia nos cínicos. Além disso, se imaginarmos a filosofia como “escola filosófica”, no sentido institucional do termo, então também não se pode falar de uma filosofia cínica. E mais ainda, se considerarmos que filosofia seja especulação justificadora do ser, da sociedade, da religião, da cultura então teremos mais razões ainda em não aceitá-los no Pantheon dos filósofos. E por fim, se considerarmos a filosofia como uma dogmática, isto é, um conjunto de crenças apoiadas em princípios, então eles não são filósofos.
Mas, se assim for, o que há de filosofia nos cínicos? Pode haver filosofia fora dessas concepções? Seja como for os cínicos desafiavam esses conceitos e se declaravam filósofos. Sua concepção de filosofia, porém, desde Antístenes, tem um caráter idiossincrático e marcadamente prático, ou se quiser, ético, mesmo que seja uma ética da interioridade subjetiva e não uma ética da efetivação objetiva. Mais que uma doutrina, o movimento cínico constitui uma filosofia de vida que alia conhecimento e virtude. Uma filosofia de inspiração socrática, radicalizando a sua forma de vida e o tema por excelência proposto por Sócrates, qual seja, a virtude ética. Mesmo não sendo uma escola, compartilham posições que os unificam num movimento que pode ser assim caracterizado: a) privilégio da prática da virtude sobre a ciência da virtude, com o conseqüente menosprezo a todo intelectualismo; b) a vida virtuosa é uma vida feliz e a vida feliz é viver de acordo com a natureza, vale dizer, não-ter-necessidade-de-nada; c) a felicidade está ao alcance de todos desde que se viva disciplinadamente; d) a essência da vida feliz é o autodomínio, a força da alma, que suporta todas as adversidades exteriores; e) a vida assim conduzida faz do indivíduo um sábio, nobre e livre e, por conseqüência, despreza as conveniências sociais; f) uso das funções corporais como uma linguagem do protesto, mais do que a linguagem articulada da lógica; g) rejeição da vida da polis com uma pregação e vivência do cosmopolismo, típica de uma fase de decadência cultural.
Diógenes representa essa postura filosófica de forma emblemática. Nele as características gerais do movimento recebem personificação. Diógenes é um cosmopolita que faz do corpo a sua linguagem, não se prendendo às convenções sociais, com um forte poder de resistência e disciplina que o faz suportar as adversidades externas, tornando-se assim livre, por nada possuir senão a própria virtude. Veremos isso passo a passo.

Diógenes, O Homem

Quem foi Diógenes? As informações sobre a vida de Diógenes são basicamente as que outro Diógenes nos legou, no caso o hagiógrafo e historiador de filosofia Diógenes Laertios (D.L), em seu livro Vidas e Doutrinas dos Filósofos Ilustres. O livro do hagiógrafo Laertios recolhe, além de vários ditos, uma série de dados biográficos do filósofo Diógenes, o cínico. Segundo Laertios, o filósofo Diógenes nasceu em Sinope, provavelmente entre os anos 412/403, e por isso é conhecido como sendo Diógenes de Sinope. Seu pai, Icésio, foi banqueiro que guardava o dinheiro do Estado e, segundo alguns, responsável por adulterar a moeda. Para outros o próprio Diógenes seria responsável pela adulteração e por conta disso foi forçado a deixar a terra natal juntamente com seu pai (D.L. p.157). Esse fato parece ser uma metáfora da vida de Diógenes. Desfigurar a moeda parece ser a missão (advinda da consulta ao oráculo) de Diógenes na medida em que faz da recusa às convenções sociais e políticas, para dar espaço à vida cínica autêntica, o seu grande projeto filosófico.
No exílio, em Atenas, encontra-se com Antístenes, seu futuro mestre. O encontro não foi muito amistoso. Laertios narra o acontecido dizendo que quando Diógenes se aproximou de Antístenes esse o repeliu com seu bastão, ao que Diógenes de Sinope “lhe oferece a cabeça dizendo: ‘golpeie, pois não acharás madeira tão dura que possa fazer-me desistir de conseguir que me diga alguma coisa, como me parece que é teu dever’. Desde essa ocasião passou a ser seu ouvinte” (D.L. p.158).
Desde a chegada a Atenas Diógenes passou a levar uma vida modesta. Mais do que modesta, pobre. Talvez até bem mais do que pobre, afinal nada possuía além de um manto dobrado sobre o corpo, um bastão para se apoiar, quando enfermo, uma sacola e se alimentava do que recebia, feito um mendigo. Algumas informações dão conta, inclusive, que ele teria sido vendido como escravo. E casa? Segundo nos informa Laertios, em certa ocasião Diógenes de Sinope teria escrito uma carta a alguém pedindo para que lhe arranjasse uma pequena casa, mas em face da demora na resposta, ele passou a morar num barril (D.L. p.158). Um manto, um bastão, uma sacola e um barril. Era tudo o que tinha. Segundo informações de Laertios ele teria encontrado o sentido para as suas dificuldades ao ver um rato correr de um lado para outro, sem destino, sem procurar um lugar para dormir, sem medo das trevas e não querendo nada do que se considerava desejável (D.L. p.185). Se o rato assim faz, porque não se pode imitá-lo? Numa ocasião Diógenes viu um menino bebendo água com as mãos em concha e jogou fora o copo que tirara da sua sacola dizendo: “‘Um menino me deu uma lição de simplicidade’” (D.L. p.161). Poucas coisas são necessárias para viver, pelo menos uma vida cínica que faz louvor à natureza contra as convenções sociais. É claro que essa vida ascética não teria nenhum sentido filosófico se não fosse acompanhada de uma razão, o que parece que Diógenes de fato tinha. Ele dizia constantemente que na vida necessitamos da razão ou então de uma corda para nos enforcarmos. Voltaremos ao alcance filosófico da forma de vida de Diógenes que, segundo Hegel é o que dá significado filosófico a Diógenes, mais do que sua filosofia teórica que, a rigor, é nula (HEGEL, 1955, p.132).
A vida errante e mendicante de Diógenes faz dele um filósofo provocador, mas igualmente provocadores são os ditos que dele temos notícias através, sobretudo, Laertios. O que nos resta são os ditos, pois a obra supostamente escrita por Diógenes, perdeu-se completamente. Alguns desses ditos ilustram bem a personalidade altiva, engenhosa e até vaidosa desse filósofo, marca registrada dos cínicos. Quando, por exemplo, foi capturado para ser vendido como escravo e lhe perguntaram o que sabia fazer, Diógenes teria respondido: “Comandar os homens”, e deu ordens ao leiloeiro para chamá-lo, caso alguém quisesse comprar um senhor (D.L. p.159). Numa certa ocasião Diógenes recusou o convite para jantar e a justificativa foi de que a última vez que estivera naquela casa o anfitrião não lhe agradecera. Um dia Diógenes estava tomando banho de sol e Alexandre, o Grande, chegou, pôs-se à sua frente e falou: “Pede-me o que quiseres!” Diógenes respondeu: “Deixe-me o meu sol” (D.L. p.162). Quando o arauto proclamou em Olímpia: “Diôxipos venceu os homens”, Diógenes o interrompeu para dizer: “Estes vencem os escravos, e eu venço os homens” (D.L. p.163). Perguntado por que as pessoas dão esmolas aos mendigos, mas nao dão aos filósofos, Diógenes respondeu: “‘Por que pensam que podem tornar-se um dia aleijados ou cegos, porém filósofos nunca’” (D.L. p.166). Certa ocasião Alexandre, o grande, o encontrou e exclamou: ‘Sou Alexandre, o grande rei’ ao que Diógenes respondeu: ‘Sou Diógenes, o cão’(D.L. p.167).
Há uma série de ditos irônicos, sarcásticos, com sacadas pitorescas e presença de espírito prático que faz de Diógenes um filósofo sagaz e ao mesmo tempo desconcertante, instigador e, às vezes, arrogante. Por exemplo: Durante uma recepção oferecida por Platão a um grupo de amigos, Diógenes pisa nos seus tapetes e diz: “‘Estou pisando na vanglória de Platão’” (D.L. p.159). Quando alguém lhe diz que era para repousar, pois estava velho, Diógenes responde: “‘Como? Se estivesse correndo num estádio eu deveria diminuir o ritmo ao me aproximar da chegada? Ao contrário, deveria aumentar a velocidade’” (D.L. p.160). A um eunuco de mau caráter que escrevera na porta da sua casa ‘Não entre aqui nenhum mal’, Diógenes comentou: “‘E por onde entra o dono da casa?’” (D.L. p.162). Vendo ratos subirem à sua mesa, o filósofo disse: “‘Vede! Até Diógenes sustenta parasitas”’(D.L. p.162). Platão definira o homem como um animal bípede, sem asas e recebeu aplausos por essa definição. Diógenes, que ironizava constantemente Platão, depenou um galo e o levou ao local das aulas, exclamando: “‘Eis o homem de Platão!’” (D.L. p.162). A alguém que lhe perguntou a que horas deveria almoçar a resposta de Diógenes foi: “‘Se fores rico, quando quiseres, se fores pobre, quando puderes”’(D.L. p.162). Quando numa ocasião Diógenes viu um serviçal sendo arrastado pelos guardiões do templo, porque roubara uma taça pertencente ao tesouro sagrado, disse: “‘Os grandes ladrões arrastam o pequeno ladrão”’(D.L. p.163). Quando viu um jovem que atirava pedras numa cruz Diógenes exclamou: “‘Muito bem! Atingirás o alvo”’ (D.L. p.163), querendo dizer com isso que se ele continuasse a apedrejar a cruz ele mesmo seria crucificado. Certa feita Diógenes pediu esmola a uma estátua e a um transeunte que viu o feito e lhe perguntou a razão respondeu: “Para habituar-me pedir em vão”. E compelido pela pobreza a pedir uma esmola a alguém, acrescentou: “‘Se já deste a outro, dá-me também, se não, comece por mim”’ (D.L. p.164). Vendo uma mulher pendurada numa oliveira Diógenes exclamou: “‘Seria ótimo se todas as árvores produzissem frutas como essa”’(D.L. p.165). Perguntaram-lhe o que havia feito para ser chamado de cão, e a resposta foi: “‘Balanço a cauda alegremente para quem me dá qualquer coisa, ladro para os que recusam e mordo os patifes”’(D.L. p.167). A alguém que lhe perguntou se a morte era um mal, Diógenes respondeu: “‘Como poderia ser um mal se quando está presente não a percebemos”’? (D.L. p.169).
Esses ditos, e muitos outros a ele atribuídos, mostram uma coisa em comum, qual seja, a filosofia para Diógenes é uma filosofia prática, como resposta do pensamento diante das eventualidades da vida cotidiana. Aliás, é essa mesmo a concepção que Diógenes tem quanto à finalidade da filosofia: “‘No mínimo, estar preparado para enfrentar todas as vicissitudes da sorte”’(D.L. p.168). Diógenes faz da filosofia uma arma retórica com uma boa dose de ironia, sarcasmo e agressividade além do comportamento despudorado, que ainda veremos, o que faz dele um filósofo fora dos moldes. Pela forma de vida e pelo seu estilo agressivo, Platão, quando perguntado sobre que espécie de homem era Diógenes, sentenciou: “‘Um Sócrates enlouquecido’” (D.L. p.165). Não dá para dizer que um morresse de amores pelo outro. Apesar de tudo, era amado pelos atenienses. Tanto era assim, nos diz Diógenes Laertios, que “quando um rapaz lhe quebrou o tonel os atenienses surraram o rapa e deram outro tonel a Diógenes” (D.L. p.163).
Diógenes morre provavelmente em 323 a. C e, segundo Laertios, as circunstâncias da sua morte são controvertidas. Várias são as versões. “Uma diz que após haver comido um polvo cru ele contraiu o cólera e morreu. Segundo outra versão, esse filósofo morreu voluntariamente, prendendo a respiração. Circulava ainda outra versão, segundo a qual Diógenes, enquanto dividia um polvo entre os cães, foi mordido no tendão do pé por um dos cães e morreu” (D.L. p.171-172). O mais curioso que passou para a história como uma possibilidade, é que Diógenes teria morrido no mesmo dia da morte de Alexandre, o grande. O mesmo Alexandre que quando perguntado sobre quem ele gostaria de ser se não fosse Alexandre, o grande conquistador, respondeu que gostaria de ter nascido Diógenes (D.L. p.160).

Procuro O Homem

A cena em que Diógenes sai pela rua, em pleno dia, com uma lanterna acesa e pronunciando a frase “procuro o homem” é uma das mais emblemáticas da história da filosofia. Emblemática pelo que ela tem de inusitado, surpreendente e provocador, mas mais emblemática ainda pelo que ela representa do ponto de vista da intencionalidade do próprio Diógenes. O ato e o dito são evidentemente sarcásticos, mas tem o poder de desnudar uma realidade que insistia em ficar escondida sobre o manto da presunção e falsidade. O “procuro o homem” tem a força do desmascaramento da realidade ancorada em valores ocos, que já não diziam do verdadeiro ser em uma cultura decadente. Tem ainda a força provocativa positiva no sentido de anunciar que o homem verdadeiro é possível de ser, desde que dele se retire o que o prende às exterioridades materiais ou convenções sociais impostas, ancorando-se somente na autenticidade de viver. Era esse o homem que Diógenes procurava. Ele procurava o homem com letra maiúscula, autêntico e coerente, o homem para além do aparecer, dos adornos externos do ter, poder e das convenções sociais. Diógenes procurava o homem reconciliado com sua genuína natureza, vivendo segundo essa natureza, sem apelos, subterfúgios ou bengalas que o desfigurassem. Essa condição e somente essa o faria feliz. Como em lugar nenhum via alguém assim, ironicamente, procurava-o.
Viver segundo a natureza, livre das convenções sociais e daquilo que adere ao homem desde fora, vivendo sob o critério da interioridade subjetiva, eis o que possibilita, para Diógenes, a reconciliação do homem consigo mesmo e, por isso, feliz. O não ter nada de próprio não é um agir contra a natureza, pelo contrário, é um agir em favor da natureza. Para viver bem e feliz não é necessário bem viver, no sentido de possuir meios de acomodação e conforto, mas viver na simplicidade pois, como ele proclamava frequentemente, “‘os deuses haviam concedido aos homens meios fáceis de vida, porém os homens perderam de vista este benefício, pois necessitam de bolos de mel, de ungüentos e de coisas semelhantes’” (D.L. p.163). A vida pobre do homem Diógenes, que tem como habitação um barril, é uma contrapartida prática sinalizadora de uma verdade que crê ser superior da verdade convencional. Agora, viver segundo a natureza significa para Diógenes, viver segundo a autonomia e liberdade dos animais. O episódio do rato correndo de um lado para o outro sem medo de nada e sem necessidade de nada é, de fato, um paradigma para Diógenes. O propósito de Diógenes é justamente trazer à vista aqueles meios fáceis de vida que todos, e não apenas alguns, têm condições de viver porque não exige nada além daquilo que a natureza oferece. Viver segundo a natureza significa bastar-se-a-si-mesmo e não-ter-necessidade-de-nada. Essa autarquia quando conquistada não pode ser perdida, pois independe das coisas exteriores que vem e vão. A autarquia, ou o bastar-se-a-si-mesmo possibilita a mais ampla liberdade, tanto da palavra quanto da ação, como veremos. E nisso Diógenes é direto e conseqüente. Ele considerava que o que prende o homem é, sobretudo, o dinheiro, símbolo da posse exterior, e por conta disso definia o amor ao dinheiro como a “metrópole de todos os males” (D.L. p.165). É como se dissesse com isso que ou se escolhe entre a autonomia e a liberdade ou se escolhe a dependência cujo dinheiro é o seu símbolo máximo. O episódio de Diógenes e Alexandre é paradigmático na compreensão da autonomia e da indiferença de Diógenes frente ao mundo. O grande conquistador poderia oferecer a Diógenes tudo o que quisesse de material e talvez de poder, mas Diógenes só quer uma coisa: “Deixe-me o meu sol”. Na verdade é tudo o que ele precisa, e é de graça, e Alexandre não pode dar, somente retirar com a sua sombra. Não somente o dinheiro e o poder são para Diógenes inibidores da liberdade porque lhe exigem um alto preço, mas também qualquer ação que exige um comprometimento posterior e de alguma forma lhe arranque a liberdade. Por isso ele “elogiava os que estavam na iminência de casar mas não casavam, os que estavam a ponto de realizar uma viagem porém não viajavam, os que pensavam em didicar-se à política mas não se dedicavam, os que desejavam constituir família e não a constituíam, os que se preparavam para conviver com os poderosos mas não se aproximavam deles” (D.L. p.159). É claro que essa postura é paradoxal, mas Diógenes não se preocupava em resolver paradoxos, vivia-os simplesmente.
Para Sócrates a natureza do homem é a sua alma, entendida essa como a inteligência, consciência e interioridade. Diógenes aceita essa tese de Sócrates, mas vai além, radicalizando-o e de alguma forma revolucionando-o. Sócrates também vivia na simplicidade e sem qualquer conforto, suportando todo tipo de adversidade corporal em nome da excelência moral. Mas Sócrates louvava a virtude da alma advinda do conhecimento e da ciência. E aí está a diferença com Diógenes. Este desprezava as ciências, as doutrinas, os discursos articulados e lógicos contrapondo um conhecimento improvisado, circunstanciado, inventivo e bem humorado. Há uma filosofia que fundamenta essa atitude, qual seja, a de que a excelência moral ou a virtude é mais uma questão de ação do que uma questão de discurso e de conhecimento. A via da ciência e do discurso é o caminho mais longo para a vida boa, para a vida ética do verdadeiro homem. É nesse sentido que se pode compreender o desprezo que Diógenes nutria pela metafísica de Platão. Diógenes Laertios nos informa que Diógenes ao ouvir as preleções de Platão sobre a “mesidade”, a “tacidade”, teria dito a Platão que ele via a mesa e a taça, mas não a mesidade e a tacidade (D.L. p.165). Temos aí uma postura que hoje poderíamos identificar com o pragmatismo na medida em que o conhecimento tem que estar a serviço da ação, em vista de um resultado, e não em vista a si mesmo. No caso de Diógenes o conhecimento devia estar a serviço de um resultado prático no nível ético.
Além disso, o “procuro o homem” tem um caráter de crítica às incoerências éticas vividas no seu tempo. Dizer algo e fazer o seu contrário é o que Diógenes identifica como uma vida inautêntica. Nesse sentido o “procuro o homem” significa dizer: procuro o homem coerente e autêntico, o que em outras palavras significa dizer que procurava o homem virtuoso no pleno sentido. Sobre isso Laertios nos dá uma informação importante dizendo que Diógenes “admirava-se vendo os críticos estudarem os males de Odisseus apesar de ignorarem seus próprios males; ou os músicos afinarem as cordas da lira, sem cuidarem de obter harmonia de sua alma; ou os oradores cansarem-se de falar em justiça, mas não a praticarem; ou os avarentos esbravejarem contra o dinheiro, enquanto na realidade o amam exageradamente. Diógenes condenava as pessoas que, embora louvando os justos por estarem acima das riquezas, invejavam os homens muito ricos. Revoltavam-no os sacrifícios aos deuses pela saúde, porque durante os próprios sacrifícios as pessoas se banqueteavam em detrimento da saúde, e se admirava quando os escravos, embora vendo seus senhores comendo desbragadamente, nada subtraíam das iguarias” (D.L. p.159).
O “procuro o homem” não tem, portanto, uma conotação teórica, metafísica, no sentido de uma busca por uma definição do que seja a essência do homem. O “procuro o homem” tem muito mais uma conotação ético prática coerente, nos moldes de vida segundo a natureza animal. O não ter necessidade, o bastar-se-a-si-mesmo, e levar uma vida coerente segundo o mínimo, possibilita uma total liberdade imediata, sem recorrer a mediações de qualquer nível. Liberdade que para Diógenes é tanto liberdade de expressão quanto liberdade de ação.

A “Parresía” e a “Anaídeia”

Não ter nada externo que o prenda é o que possibilita a liberdade. Além do que quem se basta a si mesmo, vivendo segundo os ditames da natureza, conquista uma liberdade interior impossível de ser perdida. Bens externos sempre são passíveis de serem furtados, perdidos e corrompidos, mas o bem da liberdade interior cresce constantemente e sem perigo de perdê-lo. É sob essa condição que Diógenes proclama a liberdade da palavra (parresía) como sendo o melhor bem do ser humano. Segundo Laertios, quando “alguém lhe perguntou qual era a coisa mais bela entre os homens esse filósofo respondeu: ‘A liberdade de palavra’” (D.L. p.169). E de fato, Diógenes levava isso muito a sério. Ninguém, ou poucos, se igualam a Diógenes no verbo solto. Como se diria hoje, ele não tinha papas na língua. Ele dizia o que pensava a todos, do mais simples dos mortais ao mais ilustre dos filósofos ou o mais temido dos reis, como é o caso de Platão e de Alexandre ou o seu pai Felipe II. A título de exemplo, quando em certa ocasião Diógenes é detido e levado à presença do rei Felipe II e este lhe pergunta quem ele era, Diógenes responde: “‘Um observador de tua ambição insaciável’” (D.L. p.163). Laertios nos informa que por causa dessa resposta ele teria conquistado a admiração do rei e fora posto em liberdade. Quem teria tamanha liberdade de palavra para dar uma resposta tal a que Diógenes deu ao rei?
Diógenes exercia outra liberdade, além da liberdade da palavra que ele tinha em alta estima, qual seja, a liberdade de ação (anaídeia). A liberdade de ação tem como metáfora a “desfiguração da moeda”. O “desfigurar a moeda” significa para Diógenes subverter o “nomos” (convenção) em nome da natureza. A cunhagem da moeda é o que há de mais simbólico dos valores convencionais instituídos pelo homem em sociedade. Adulterar a moeda equivale então a revolucionar a tábua dos valores ancorados no convencional para uma tábua de valores ancorados na vida segundo a natureza. Diógenes assumiu como missão filosófica exatamente essa revolução. O “desfigurar a moeda” está na origem da sua vocação ou conversão à filosofia. O “desfigurar a moeda”, antes de ser uma questão econômica é uma questão de ordem política, religiosa, filosófica e comportamental. De ordem política na medida em que Diógenes insistia para que as pessoas se abstivessem de todo engajamento político que pudesse pôr limites à liberdade individual. Assim deve ser compreendida a postura cosmopolita de Diógenes que desprezava a pólis e se proclamava cidadão do mundo (D.L. p.168). De ordem religiosa na medida em que inverte a hierarquia tradicional dos seres. No lugar da série animal-homem-deus, Diógenes propunha a série homem-animal-deus. A razão dessa “desfiguração” é de que, para o homem desejante e angustiado, o animal e deus representam um modelo teórico e prático superior na medida em que estes vivem segundo a auto-suficiência e indiferença, prerrogativas essenciais para uma vida feliz. A desfiguração de ordem filosófica na medida em que rejeitava qualquer filosofia que pretendesse ser sistemática e metafísica, máxime Platão, preferindo demonstrar suas crenças por meio de ações. Nesse sentido a filosofia não mais deveria ser reservada a uma elite, mas todos poderiam filosofar.
A demonstração de suas crenças por meio de ações faz parte da “desfiguração” comportamental de Diógenes. A liberdade de ação comportamental é tão audaz que chega a beirar ao abuso e ao humorístico que, se não interpretada cuidadosamente poderia sinalizar mais um desvario escandaloso e inconseqüente do que propriamente uma postura filosófica. O fato é que pela liberdade de ação “ele pretendeu demonstrar a mera convencionalidade e, portanto, não naturalidade de certos usos e costumes gregos” (REALE, 1994, p. 28). Várias são as informações que Diógenes Laertios registra a este respeito. Por exemplo: “Ele costumava fazer tudo em público, inclusive os trabalhos de Deméter e de Afrodite (comer e copular) e se justificava com os seguintes argumentos: ‘Se fazer as refeições não é absurdo, então não é absurdo fazê-las na praça do mercado’” (D.L. p.169). Diógenes costumava masturbar-se em público e ainda ironizava dizendo: “‘Seria ótimo se pudesse aplacar a fome esfregando o estômago’” (D.L. p.170). A desfiguração das convenções sociais, porém, chegava ao extremo e beirava a grosseria: “Alguém o levou a uma casa magnífica e o proibiu de cuspir, diante disso ele pigarreou profundamente e expectorou no rosto da pessoa, pois não encontrava, disse ele, um lugar pior” (D.L. p.160).
A liberdade de ação é, para Diógenes, liberdade de movimento e de uso do corpo sem restrições de nenhuma ordem. A vida em sociedade tem lá suas etiquetas de bom comportamento e, sobretudo, de controle corporal. A palavra para o civilizado e para o que vive segundo as convenções sociais é o meio quase que exclusivo para manifestar o seu ponto de vista. Ora, é exatamente isso que Diógenes ultrapassa com a liberdade de ação aproximando o homem ao animal. Essa atitude de desfiguração o torna um “cão” de verdade, aproximando-se ao extremo da vida natural animal. O alcance dessa atitude pode ser pensada sob uma nova linguagem, a linguagem do corpo ou o corpo como linguagem.

O Corpo Como Linguagem

Diógenes se expressava livremente pela palavra e, como vimos, ele tinha para si que a coisa mais bela entre os homens é “liberdade da palavra” (D.L. p.169). Mas, a palavra que fala mais alto não é tanto a palavra falada ou escrita, senão a palavra gestual, a palavra cujo signo é o próprio corpo. A palavra é então, ao mesmo tempo, ação. Ação livre do próprio corpo. Não que os cínicos, e sobretudo Diógenes, não dominassem a retórica ou que fossem de tal forma rudes e ignorantes que não soubessem persuadir pela fala e pela escrita. Muito pelo contrário, como demonstra Branham (2007, p.95ss), os cínicos, máxime Diógenes, são exímios no uso da dialética, erística e retórica. E Laertios não deixa dúvidas quanto ao poder persuasivo da fala de Diógenes. Diz Laertios: “Diógenes era extraordinariamente rápido para responder a perguntas que lhe eram feitas [...] e possuía o dom maravilhoso de persuadir, de tal maneira que seus argumentos prevaleciam sobre os de qualquer pessoa” (D.L. p.171).
O que queremos expressar, contudo, com o título dessa sessão, qual seja, o “corpo como linguagem”, vai além do uso retórico da palavra falada e supostamente escrita por Diógenes. Ela remete aos atos significativos de alto poder comunicativo com o mínimo possível de palavras e quase ausência completa de uma teoria orgânica aos moldes dos metafísicos, sobretudo Platão. Aliás, é Platão quem mais sofre nas mãos de Diógenes. Como nos informa Laertios, quando numa certa ocasião o metafísico Platão expôs a sua teoria das idéias recorrendo a neologismos como “mesidade” e “tacidade”, para dizer da essência da mesa e da taça, Diógenes ponderou: “A mesa e a taça eu vejo, Platão, porém tua mesidade e tacidade não posso ver de forma alguma” (D.L. p.165). Mais significativo ainda quanto ao confronto Platão e Diógenes e, sobretudo, quanto à expressão gestual como arma retórica é o episódio narrado por Diógenes Laertios referente ao método de divisão e reunião, empregado por Platão, para definir o homem como “um bípede sem penas”. Diógenes não teve dúvidas, nos conta Diógenes Laertios, “depenou um galo e o levou ao local das aulas, exclamando: ‘Eis o homem de Platão’” (D.L. p.162). Nesse episódio temos duas coisas, o ato, o galo depenado, e a fala, “eis o homem de Platão”.
Mas há vários episódios em que o ato é solitário, sem o recurso à fala para se expressar, valendo-se somente do corpo como instrumento de comunicação e expressão. Assim ocorre quando numa certa ocasião em que ninguém prestava atenção a um discurso seu que considerava sério, ele começou a assoviar e todos se aglomeraram à sua volta. Claro, depois ele censura a multidão exatamente por não ser ouvido nas coisas sérias, mas todos prestarem atenção para ouvir uma tolice. Quando num banquete algumas pessoas lançaram-lhe ossos como a um cão, Diógenes levantou-se e urinou sobre os ossos, como faria um cão (D.L. p.164). Emblemático é ainda o caso narrado por Laertios dando conta que numa ocasião Diógenes entra numa festa de jovens com metade da cabeça raspada e é recebido a bordoadas. Ele sai do recinto e escreve numa tabuleta os nomes daqueles que o tinham espancado e passou com a tabuleta pendurada no pescoço até haver coberto seus autores de ridículo e levá-los à execração e descrédito público (D.L. p.160). O mais emblemático, contudo, é o que segue. Quando alguém sustentava animadamente a tese da impossibilidade do movimento, fazendo eco à teoria de Zenão de Eléia, Diógenes ao invés de argumentar contra a tese, simplesmente “levantou-se e começou a caminhar” (D.L. p.162). Não parece haver algo mais paradigmático na tomada do corpo como linguagem. Nenhuma explicação teórica teria o alcance de contra-argumento tal qual o gesto de Diógenes. E para isso não se valeu de nenhum argumento senão o corpo em movimento.
Mas, não só nesses atos significativos o corpo é linguagem para Diógenes. Ele é linguagem em grau ainda maior enquanto instrumento para atacar a artificialidade e a falsidade dos códigos oficiais da vida dita civilizada. Aqui nós poderíamos pensar a força da corporeidade como linguagem no exercício da liberdade contra a doxa ou a opinião pública e em favor da natureza no ato de masturbação pública, no comer em público, no urinar em público, no defecar em público, na vida mendicante do asceta Diógenes que se expõe apenas com um manto, um cajado e uma sacola. Em tudo isso há uma linguagem, uma comunicação, uma mensagem que passa pelo contra-senso muito bem expressa num ato, também corporal, que é de entrar no teatro “encontrando frente a frente os espectadores que saíam” (D.L. p.168). A explicação que o próprio Diógenes dava para aqueles que lhe perguntava por que fazia isso torna-se uma chave interpretativa esclarecedora: “Isso é o que procuro fazer em toda a minha vida”. Significando: eu sou a consciência invertida da vida civilizada colocando-me na contramão para chocar e fazer pensar nas artificialidade da vida social. Há uma pedagogia do choque que só pode vir do contra-senso, do ridículo, do sarcástico, do irônico e, às vezes, do obsceno e escandaloso, para levar o interlocutor a repensar a sua posição frente o mundo. Há nisso uma pedagogia consciente e não puro enloquecimento como Platão definia Diógenes. Pedagogia que Laertios expressava em analogia com a música. “Diógenes dizia que imitava o exemplo dos instrutores dos coros; de fato, estes dão o tom mais alto para que todos os outros dêem o tom certo” (D.L. p.161). Dar o tom mais alto não para chamar a atenção sobre si mesmo, mas para que os outros prestem atenção no próprio tom. Se para isso é preciso beirar a loucura, então beira-se a loucura. Tem coisas que só o louco pode dizer para salvar a própria racionalidade. Ou como diz São Paulo: “Ninguém se iluda: se alguém dentre vós julga ser sábio aos olhos do mundo, torna-se louco para ser sábio” (1 Cor, 3,18).


Bibliografia:

BRANHAM, R. Bracht. Desfigurar a moeda. A retórica de Diógenes e a invenção do cinismo. In: GOULET-GAZÉ, Marie-Odile; BRANHAM, R. Bracht. (Org.). Os Cínicos. O movimento cínico na Antiguidade e o seu legado. São Paulo: Loyola, 2007. pp.95- 119.

GOULET-GAZÉ, Marie-Odile; BRANHAM, R. Bracht. (Org.). Os Cínicos. O movimento cínico na Antiguidade e o seu legado. São Paulo: Loyola, 2007.

HEGEL, G. FW.F. Lecciones sobre la historia de la filosofia. México: Fondo de Cultura Económica, 1955. Vol. II.

LAERTIOS, Diógenes. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. 2. ed. Brasília: UnB, 1977.

REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. São Paulo: Loyola, 1994. Vol. III.